Um fado Tropical ~ Porto Total, capital do dragão... summary_noimg = 550; summary_img = 450; img_thumb_height = 200; img_thumb_width = 200;

18 de junho de 2014

Um fado Tropical

1- Pior começo era impossível: penalty aos 10 minutos, lesões aos 28 e aos 63, expulsão aos 30, 0-3 ao intervalo, sem que Patrício tenha feito uma só defesa. Queixas antes do jogo, com o horário (marcado há seis meses e igual para todos) , com os dez minutos de atraso na chegada do autocarro com a Selecção ao estádio e queixas com a arbitragem desde o inicio, vindas do banco para dentro do campo, conforme é táctica de há muito estabelecida entre nós. A arbitragem não nos correu bem, de facto, mas apenas o penalty não assinalado sobre Éder foi erro claro: nas outras decisões, João Pereira e Pepe puseram-se a jeito. Mas nada disso consegue esconder os dois golos já sofridos antes da expulsão de Pepe, a evidente superioridade do futebol dos alemães e a clara falta de mentalização dos jogadores, que os levasse a preocuparem-se menos com as decisões do árbitro e mais com precipitações inaceitáveis num Mundial

— como o penalty de João Pereira, as três ofertas de golo de Patrício, de que, felizmente, só uma foi aproveitada, a incapacidade (mais uma!) de Pepe se controlar, a displicência do corte de Bruno Alves que deu o 0 3, etc.

Ninguém me tira da cabeça que aquilo a que chamo a diarreia prévia de patriotismo e o excesso de vedetismo, com os jogadores transformados nos novos heróis do mar, o Paulo Bento posando para a publicidade em atitude de Infante D. Henrique contemplando o mar a ser desbravado, tudo isso conduz a um excesso de auto-convencimento que acaba fatalmente em desastre quando se encontra pela frente gente que está habituada a trabalhar no duro para chegar aos resultados.

Não, não nos basta ter «o melhor jogador do mundo», se ele é a única alternativa que conhecemos. Que se aproveite, ao menos, a lição deste jogo inaugural contra a Alemanha para um banho de humildade que possa evitar o pior dos cenários.

2- Já se sabia que este iria ser um Mundial disputado em condições bem difíceis, atendendo ao clima do Brasil e à distância a percorrer pelas equipas entre jogos. Mesmo não sendo actualmente Verão no Brasil, do Rio de Janeiro para cima o Inverno brasileiro tem temperaturas de Verão europeu e humidade de sauna a que não estamos habituados. Jogar à uma da tarde em Salvador ou às sete da tarde em Manaus (necessidades televisivas a tal obrigam) transformam-se no primeiro e mais sério problema que qualquer selecção tem de enfrentar. Ora, a nós calhou-nos essa fava logo de entrada: jogar à uma da tarde em Salvador e às sete da tarde em Manaus. E, com esta programação, a decisão de fazer um pré-estágio na costa leste dos Estados Unidos e montar depois quartel-general em Campinas acarreta riscos que talvez nunca se saiba ao certo se foram bem assumidos ou mal pensados.

Quanto ao estágio norte-americano, ele teve desde logo como consequência envolver mais uma viagem transatlântica e umas sete horas de voo a mais do que se a Selecção tivesse ido directa para o local de estágio no Brasil.

Para uma equipa que vai ter de fazer três viagens de médio curso, de ida e volta, por cada um dos jogos da primeira fase - Salvador, Manaus e Brasília - pareceria que tudo o que pudesse poupar o desgaste das horas de voo seria conveniente. Li que o fácil acesso do hotel de Campinas ao aeroporto de Víracopos foi um dos factores determinantes da escolha. Mas não vejo como é que isso pode compensar a desvantagem do número de horas suplementares passadas no avião. Sabendo-se de antemão as três cidades onde Portugal iria jogar, a mim parece-me que optar por ter quartel-general em Salvador ou no Recife seria melhor opção. É certo que o clima é aí mais forte e os treinos seriam mais puxados, mas, não só poderiam estes ser feitos a horas de calor mais brando, como a adaptação ao clima que a equipa terá de enfrentar nos jogos seria mais eficaz.

Enfim, é apenas um desabafo, porque certamente alguém que é pago para pensar nestas coisas melhor do que eu o terá feito. Logo se verá se acertadamente. Oxalá que sim.

3- 0 Mundial começou com uma exibição descolorida da Selecção de Scolari, terminando com a habitual prevalência do resultado sobre o espectáculo, que é uma das imagens de marca do seleccionador brasileiro. Para isso é que a CBF o foi buscar, depois de ele ter acabado de despromover o histórico Palmeiras à segunda divisão. Como habitualmente também, a Selecção anfitriã beneficiou da determinante ajuda FIFA, sob e forma de um penalty descaradamente inventado pelo árbitro, logo seguido de dois golos limpos anu lados ao México e que podem ser importantes em termos de atribuição do primeiro lugar do grupo.

Começou mal o Mundial, cheio de falhas de organização e de casos de arbitragem (e há quem insista que árbitros estrangeiros no nosso campeonato resolveriam todos os problemas!).

4- Eu gosto das selecções que se comportam como a holandesa, não transformando os estágios em reuniões secretas, em fortalezas inexpugnáveis e não
fazendo de cada detalhe à volta da equipa uma notícia de importância extrema. Lembro-me sempre da célebre selecção da Dinamarca que, chamada à última hora para substituir a Jugoslávia num Europeu, requisitou os jogadores que já estavam em férias, permitiu-lhes vir para o estágio com as mulheres e as namoradas, concentrou todos apenas dois dias antes do primeiro jogo e, no fim, acabou campeã, ridicularizando todas as elaboradas teorias sobre concentrações e estágios. Pois a Selecção holandesa neste Mundial, desprezando as imposições extremas de segurança e a propalada necessidade de isolamento para melhor trabalhar, resolveu montar estágio em Ipanema, conceder algumas liberdades nocturnas aos jogadores, e chegou ao cúmulo de atravessar o calçadão em frente ao hotel e ir treinar para a praia, no meio do povão. E, depois, sabe-se o que aconteceu, na hora da verdade: deu um salto a Salvador e desbaratou a Espanha, campeã do Mundo, deixando os espanhóis de gatas, com Robben, seis anos a mais que Sérgio Ramos, correndo a 37 kms por hora, ganhando-lhe dez metros em trinta de corrida, para marcar o quinto golo da Holanda.

5- O Espanha-Holanda pós frente a frente dois jogadores que, em minha opinião, há muito merecem o titulo de melhor jogador do mundo: Andrés Iniesta e Arien Robben. Ambos são jogadores de luxo: na recepção, no passe, na finta, no remate, na exploração dos espaços, na inteligência com que jogam. Mas não podem ganhar o título porque lhes faltam diversas outras qualidades essenciais para tal: não usam brincos nem pulseiras; não têm tatuagens; não têm cortes de cabelo inspirados nos mais estranhos animais da natureza (aliás, nem sequer têm cabelo); não têm milhões de seguidores no Facebook: e não acompanham com top-models. Enfim, são pouco profissionais...

No duelo entre ambos, Iniesta começou bem, mas, tal como toda a equipa espanhola, foi atropelado na segunda parte pela cavalgada das valquírias do Pais Baixo. E, sobretudo, por um fabuloso Arien Robben, que em tempos o Real Madrid desperdiçou. Foi daquelas exibições que ficam para a história do futebol.

6- 0 desfecho das eleições da Liga seria de morrer às gargalhadas, se não fosse o sinal que faltava da podridão em que aquele instituição caiu. Através de anunciados «ventos e fezes», Bruno da Carvalho lá conseguiu fazer eleger o seu candidato imaculadamente limpo, garantindo, com a reeleição do inqualificável Mário Figueiredo, a continuação do apoio da Liga em momentos decisivos. Mesmo que, num universo eleitoral de 35 clubes, só 7 tenham votado nele, com todos os outros a reclamaram da chapeia da ao pior nível de uma qualquer República das Bananas. Eu sei que há gente para tudo, mas nunca tinha assistido a alguém capaz de se agarrar ao poder, numa suposta democracia, com um cardápio de truques tão imaginativo quanto destituído de qualquer resquício de pudor. Tenham, pelo menos, a noção do ridículo de não voltarem a falar da credibilização do futebol português! Os autores de casos de policia não podem ser policias de casos. Que grande época que se perspectiva!