1- Na semana passada, após a derrota no Funchal, Paulo Fonseca queixou-se de que a equipa «entrara mal no jogo» — uma queixa tantas vezes repetida que a única perplexidade levantada é a de entender por que razão, então, ele não corrige as coisas e obriga a equipa a entrar bem nos jogos. Quarta-feira, no jogo da Taça com o Estoril, lá se repetiu a cena e, sem surpresa alguma, o Estoril foi para o intervalo a vencer. E anteontem, recebendo o último da classificação, o FC Porto deu meia partida de avanço ao adversário, só indo a vencer para o intervalo graças a uma grande injustiça e a um daqueles penalties que eu abomino e que raramente marcaria se fosse árbitro.
Nada do que está mal muda, portanto. A gente observa os jogos do FC Porto, vê os mesmos erros e impotência de sempre a serem repetidos, e lá estão o treinador e o seu adjunto sempre agarrados a uns auscultadores, conversando calmamente junto à lateral, com um ar absolutamente perdido, de quem não entende sequer o que se passa e muito menos o que fazer para que se passe diferente. Tenho impressão que, há trinta anos, pelo menos, que não vejo um FC Porto tão mau, tão mal orientado, tão carecido de liderança. Diz o triste Paulo Fonseca que não se podem esquecer as boas exibições já feitas pela equipa: quais? Só me lembro de uma, a primeira da época, na final da Supertaça contra o Guimarães, quando os jogadores ainda não tinham, como se diz, «assimilado» a ausência de ideias do treinador. Depois, disso, houve uns dois jogos com bons momentos mas desfechos infelizes na Liga dos Campeões, e nada mais. O que mantém o FC Porto ainda agarrado à máquina, a quatro pontos do Benfica e nas meias-finais da Taça e da Taça da Liga, são apenas alguns momentos de inspiração individual que se conseguem sobrepor à nulidade do seu futebol colectivo —como o rasgo de Alex Sandro (o melhor profissional da equipa, na relação qualidade/entrega), que permitiu eliminar o Estoril da Taça ao cair do pano. Mas mesmo isso vai-se tomando cada vez mais raro, pois que um dos dons de Paulo Fonseca - e que é sinal infalível de um treinador que não serve - é o de, um por um, ter conseguido pôr todos os jogadores a jogar pior do que sabem. De tal maneira que, neste momento, eu, que acreditei que, apesar da saídas de Moutinho e James, o FC Porto tinha um grande plantel para enfrentar a época, já não sei se fui enganado por optimismo ou se é o fraco rei que faz fraca a forte gente. Sei é que, tirando o caso exemplar de Alex Sandro e o entusiasmo que ainda não esmoreceu de Ricardo Quaresma, tudo o resto, todos os outros, são almas penadas que por ali andam, uma espécie de funcionários públicos do futebol, arrastando as camisolas e as pernas, afastando o público do Dragão, jogando como se tivessem esquecido tudo o que sabiam.
Aquilo que. com infinita generosidade, se poderia chamar o «esquema de jogo» de Paulo Fonseca não passa disto: o Helton repõe a bola em jogo, entregando-a a um dos centrais (o que não é uma jogada isenta de perigos); a bola rola de um central para o outro e regressa ao primeiro; daqui segue para um lateral, que volta a atrasar para um central; deste, segue para o outro lateral que a entrega ao Varela; este, ou perde imediatamente a bola (o mais provável) ou volta a atrasá-la para o lateral, aliviado e contente por se desfazer dela; do lateral, segue então para o Fernando, que tabela com o outro médio defensivo; este, finalmente, arrisca um passe para a frente, falha e segue-se contra-ataque do adversário e pânico na defesa. Diagnóstico de Paulo Fonseca: tivemos muita posse de bola mas dificuldade em penetrar nas linhas adversárias, porque elas estavam muito recuadas.
De facto, só quem lá vai é que saberá dizer porque vai ainda ao Dragão! E vamos ter de aturar isto até final da época ou pior ainda, até que Pinto da Costa se dê por satisfeito - isto é, até que a vontade de mostrar que quem manda ali é ele e só ele seja finalmente ultrapassada pela indisponibilidade de continuar a ver o nosso FC Porto a jogar ao nível de um Paços de Ferreira.
2- Nada me poderia espantar menos do que ver a comissão de inquéritos da Liga defender a punição do FC Porto por se ter atrasado 2.45 minutos com a sua exclusão da Taça da Liga. Há sinais no ar que não enganam e que mostram que o medíocre presidente da Liga, na iminência de poder ser apeado pelo clubes à vista da sua exibida incompetência, se agarrou a uma bóia de salvação chamada Bruno de Carvalho para se tentar manter a flutuar à superfície. Juntos, vão «moralizar o futebol português», inaugurando »uma nova era», como diz o ridículo presidente da AFL.
E também nada me poderia espantar menos do que ler a argumentação jurídica dos serviços da Liga para justificar essa nova era de moralização, que começa por garantir na secretaria o que não se ganhou em campo. Apesar de tudo, havia, reconhecidamente, duas pequenas-enormes dificuldades jurídicas a resolver previamente ao fim desejado: fazer prova do dolo dos portistas; e fazer prova das vantagens competitivas asseguradas por esse dolo. Mesmo sabendo eu de há muito que o futebol português é habitado por uma escola dos piores juristas que este país alguma vez produziu, gente que disfarça a sua ignorância com recurso a uma linguagem pomposa-jurídica de um ridículo mortal, mesmo assim, até para esses crânios jurídicos a tarefa não se antevia fácil.
Mas, qual o quê! O dolo resolveu-se presumindo-o. E com um pormenor delicioso: a presunção baseia-se, não na existência de dados que levem a desconfiar da premeditação da coisa, mas justamente do contrário. Ou seja porque o capitão do FC Porto, em lugar de ter uma desculpa já preparada nas altas instâncias do clube para justificar o atraso, terá antes dito simplesmente ao árbitro «atrasámo-nos», eis a prova cabal, arrasadora, irrebatível, do dolo.
Quanto às vantagens daí extraí das, nem foi necessário aos juristas da Liga perderem tempo a identificá-las, de tal maneira a acharam evidentes por si. De facto, só uma besta é que não percebe que, assim que chegou ao Dragão a notícia do fim do jogo do Sporting, logo Paulo Fonseca de ordem aos seus jogadores para marcarem o golo que faltava — um golpe no qual, aliás, o Marítimo colaborou de boa vontade. É verdade que quatro minutos antes já o FC Porto poderia ter chegado a esse golo se o árbitro tem assinalado um penalty anterior, referido por toda a crítica. E dois minutos antes do terceiro golo portista o próprio Marítimo só não acabou com todas as dúvidas, marcando ele o golo da vitória, porque Fabiano resolveu fazer uma defesa do outro mundo. Mas isso, como se compreende, foram apenas por menores que serviram para melhor disfarçar a golpaça.
Este sábado, o José Eduardo contava aqui a história da amizade que mantém, via mail, com um inglês adepto do Crystal Palace e a quem passou a semana a explicar o último escândalo do futebol português. E diz ele que o inglês ficou espantado e só comentou «essas coisas não se passam aqui!». Intrigado com isto, pus-me em campo e descobri quem era o inglês e perguntei-lhe se a história era verdadeira. Eis o que ele me respondeu:
— Oh, God, Miguel, what a mess, que grande confusão! O que eu disse ao José Eduardo, mas deve ter ficado lost in translation, é que aqui os clubes não se atreveriam a querer ganhar na secretaria o que não tinham ganho em campo com o pretexto de que o rival se atrasou 2.45 minutos a entrar em campo. E que aqui, nem o dolo nem as vantagens ilícitas se presumem: provam-se. Aliás, até lhe perguntei se, sendo assim tão evidente a vantagem de começar a jogar mais tarde que os rivais, por que razão o Sporting, que começou a jogar com a Académica depois de o Porto ter perdido na véspera e de o Benfica ter empatado umas horas antes, não foi capaz de tirar vantagem disso?.
Andam tristes os portistas. Ma sempre nos vamos rindo.
Nada do que está mal muda, portanto. A gente observa os jogos do FC Porto, vê os mesmos erros e impotência de sempre a serem repetidos, e lá estão o treinador e o seu adjunto sempre agarrados a uns auscultadores, conversando calmamente junto à lateral, com um ar absolutamente perdido, de quem não entende sequer o que se passa e muito menos o que fazer para que se passe diferente. Tenho impressão que, há trinta anos, pelo menos, que não vejo um FC Porto tão mau, tão mal orientado, tão carecido de liderança. Diz o triste Paulo Fonseca que não se podem esquecer as boas exibições já feitas pela equipa: quais? Só me lembro de uma, a primeira da época, na final da Supertaça contra o Guimarães, quando os jogadores ainda não tinham, como se diz, «assimilado» a ausência de ideias do treinador. Depois, disso, houve uns dois jogos com bons momentos mas desfechos infelizes na Liga dos Campeões, e nada mais. O que mantém o FC Porto ainda agarrado à máquina, a quatro pontos do Benfica e nas meias-finais da Taça e da Taça da Liga, são apenas alguns momentos de inspiração individual que se conseguem sobrepor à nulidade do seu futebol colectivo —como o rasgo de Alex Sandro (o melhor profissional da equipa, na relação qualidade/entrega), que permitiu eliminar o Estoril da Taça ao cair do pano. Mas mesmo isso vai-se tomando cada vez mais raro, pois que um dos dons de Paulo Fonseca - e que é sinal infalível de um treinador que não serve - é o de, um por um, ter conseguido pôr todos os jogadores a jogar pior do que sabem. De tal maneira que, neste momento, eu, que acreditei que, apesar da saídas de Moutinho e James, o FC Porto tinha um grande plantel para enfrentar a época, já não sei se fui enganado por optimismo ou se é o fraco rei que faz fraca a forte gente. Sei é que, tirando o caso exemplar de Alex Sandro e o entusiasmo que ainda não esmoreceu de Ricardo Quaresma, tudo o resto, todos os outros, são almas penadas que por ali andam, uma espécie de funcionários públicos do futebol, arrastando as camisolas e as pernas, afastando o público do Dragão, jogando como se tivessem esquecido tudo o que sabiam.
Aquilo que. com infinita generosidade, se poderia chamar o «esquema de jogo» de Paulo Fonseca não passa disto: o Helton repõe a bola em jogo, entregando-a a um dos centrais (o que não é uma jogada isenta de perigos); a bola rola de um central para o outro e regressa ao primeiro; daqui segue para um lateral, que volta a atrasar para um central; deste, segue para o outro lateral que a entrega ao Varela; este, ou perde imediatamente a bola (o mais provável) ou volta a atrasá-la para o lateral, aliviado e contente por se desfazer dela; do lateral, segue então para o Fernando, que tabela com o outro médio defensivo; este, finalmente, arrisca um passe para a frente, falha e segue-se contra-ataque do adversário e pânico na defesa. Diagnóstico de Paulo Fonseca: tivemos muita posse de bola mas dificuldade em penetrar nas linhas adversárias, porque elas estavam muito recuadas.
De facto, só quem lá vai é que saberá dizer porque vai ainda ao Dragão! E vamos ter de aturar isto até final da época ou pior ainda, até que Pinto da Costa se dê por satisfeito - isto é, até que a vontade de mostrar que quem manda ali é ele e só ele seja finalmente ultrapassada pela indisponibilidade de continuar a ver o nosso FC Porto a jogar ao nível de um Paços de Ferreira.
2- Nada me poderia espantar menos do que ver a comissão de inquéritos da Liga defender a punição do FC Porto por se ter atrasado 2.45 minutos com a sua exclusão da Taça da Liga. Há sinais no ar que não enganam e que mostram que o medíocre presidente da Liga, na iminência de poder ser apeado pelo clubes à vista da sua exibida incompetência, se agarrou a uma bóia de salvação chamada Bruno de Carvalho para se tentar manter a flutuar à superfície. Juntos, vão «moralizar o futebol português», inaugurando »uma nova era», como diz o ridículo presidente da AFL.
E também nada me poderia espantar menos do que ler a argumentação jurídica dos serviços da Liga para justificar essa nova era de moralização, que começa por garantir na secretaria o que não se ganhou em campo. Apesar de tudo, havia, reconhecidamente, duas pequenas-enormes dificuldades jurídicas a resolver previamente ao fim desejado: fazer prova do dolo dos portistas; e fazer prova das vantagens competitivas asseguradas por esse dolo. Mesmo sabendo eu de há muito que o futebol português é habitado por uma escola dos piores juristas que este país alguma vez produziu, gente que disfarça a sua ignorância com recurso a uma linguagem pomposa-jurídica de um ridículo mortal, mesmo assim, até para esses crânios jurídicos a tarefa não se antevia fácil.
Mas, qual o quê! O dolo resolveu-se presumindo-o. E com um pormenor delicioso: a presunção baseia-se, não na existência de dados que levem a desconfiar da premeditação da coisa, mas justamente do contrário. Ou seja porque o capitão do FC Porto, em lugar de ter uma desculpa já preparada nas altas instâncias do clube para justificar o atraso, terá antes dito simplesmente ao árbitro «atrasámo-nos», eis a prova cabal, arrasadora, irrebatível, do dolo.
Quanto às vantagens daí extraí das, nem foi necessário aos juristas da Liga perderem tempo a identificá-las, de tal maneira a acharam evidentes por si. De facto, só uma besta é que não percebe que, assim que chegou ao Dragão a notícia do fim do jogo do Sporting, logo Paulo Fonseca de ordem aos seus jogadores para marcarem o golo que faltava — um golpe no qual, aliás, o Marítimo colaborou de boa vontade. É verdade que quatro minutos antes já o FC Porto poderia ter chegado a esse golo se o árbitro tem assinalado um penalty anterior, referido por toda a crítica. E dois minutos antes do terceiro golo portista o próprio Marítimo só não acabou com todas as dúvidas, marcando ele o golo da vitória, porque Fabiano resolveu fazer uma defesa do outro mundo. Mas isso, como se compreende, foram apenas por menores que serviram para melhor disfarçar a golpaça.
Este sábado, o José Eduardo contava aqui a história da amizade que mantém, via mail, com um inglês adepto do Crystal Palace e a quem passou a semana a explicar o último escândalo do futebol português. E diz ele que o inglês ficou espantado e só comentou «essas coisas não se passam aqui!». Intrigado com isto, pus-me em campo e descobri quem era o inglês e perguntei-lhe se a história era verdadeira. Eis o que ele me respondeu:
— Oh, God, Miguel, what a mess, que grande confusão! O que eu disse ao José Eduardo, mas deve ter ficado lost in translation, é que aqui os clubes não se atreveriam a querer ganhar na secretaria o que não tinham ganho em campo com o pretexto de que o rival se atrasou 2.45 minutos a entrar em campo. E que aqui, nem o dolo nem as vantagens ilícitas se presumem: provam-se. Aliás, até lhe perguntei se, sendo assim tão evidente a vantagem de começar a jogar mais tarde que os rivais, por que razão o Sporting, que começou a jogar com a Académica depois de o Porto ter perdido na véspera e de o Benfica ter empatado umas horas antes, não foi capaz de tirar vantagem disso?.
Andam tristes os portistas. Ma sempre nos vamos rindo.