1- Como ontem rezava A Bola, o Sporting está dividido entre a revolta e a raiva, ao ver-se prematuramente afastado de mais uma competição, e até o talho do árbitro do Porto-Marítimo, na pacata terra de Vilaverde, foi vandalizado por fiéis vigilantes sportinguistas, como já antes acontecem. Para tudo dizer, e usando palavras do grande sportinguista Eduardo Barroso, vai por aí uma «peixeirada» e um «fartar vilanagem», com o guerrilheiro Bruno de Carvalho à cabeça. E, então, de que se queixam eles, desta vez?
Não, com certeza dos descontos dados por Manuel Mota, no Porto-Marítimo, pois que ainda há dias se queixavam de só terem tido direito a 4 minutos de descontos na Amoreira. Não, certamente, do penalty que qualificou o FC Porto ao minuto 95, pois esse não vi ninguém que o tenha contestado (apesar de, obviamente, não coincidir com o «intensómetro» de Bruno de Carvalho). Em comparação com o penalty que deu o 3-1 ao Sporting em Penafiel - filho da velha escola leonina dos penalties à Manuel Fernandes e João Pinto, que consiste em adiantar a bola ao defesa e ficar à espera da perna dele para se fazer auto-rasteirar - o penalty do Dragão foi tão menos espectacular quanto mais sério. E, nem vale a pena comparar o de Penafiel com os dois perdoados ao Sporting no jogo com o Marítimo em Alvalade (nem haveria peixeirada alguma se eles têm sido assinalados). Assim, resta ao Sporting queixar-se de o jogo do Dragão ter começado 3 minutos mais tarde do que o de Penafiel e ter acabado... 4 minutos mais tarde. Concordo que não deveria ter acontecido e que o responsável ou responsáveis pelo atraso devem ser punidos conforme os regulamentos prevêem (embora não se perceba que o delay, que já vinha desde o início de ambos os jogos, não tenha sido corrigido ao intervalo por quem de direito). Mas, para que, à conta disso, se conclua pela conspiração, será necessário fazer prova de duas coisas: que o FC Porto só estava à espera de saber o resultado final do Sporting para decidir então quantos golos mais precisava de marcar ao Marítimo e que este, num gesto de boa vontade e em contraste com tudo o que até aí havia feito no jogo, se dispôs a facilitar as necessidades portistas. Nada que esteja fora do alcance da capacidade argumentativa do Sporting.
2- Por mim, o essencial deste desfecho está algures. Vi os 60 minutos finais do Sporting-Marítimo, da segunda jornada, e os 60 minutos iniciais do Porto-Marítimo da terceira jornada. Falta-me, pois, o conhecimento de causa completo para poder arriscar esta conclusão: nem Porto nem Sporting; quem merecia ter passado adiante era o Marítimo. Deu 60 minutos de banho de bola em Alvalade e outros tantos no Dragão. Sem esquecer o notável desempenho do Penafiel, que, em 17 dias empatou no Funchal, perdeu no Dragão, venceu Porto B e Benfica B para o seu campeonato e, enquanto as forças lho permitiram, ainda fez uma primeira parte contra o Sporting em que não se percebia qual das equipes era da primeira Liga.
3- Bruno de Carvalho (leia-se o Sporting) apresentou um plano para reformulação, ou moralização ou qualquer coisa em ão, do futebol português. Do que li, o dito plano parece-me pensado pela rama: um conjunto de banalidades e lugares-comuns, já muitas vezes ditas por outros e nunca suficientemente meditadas, além de lacunas evidentes e gritantes. Uma coisa para marcar terreno e reunir em Alvalade 22 súbditos atraídos pela possibilidade de mais dinheiro a cair do céu, dando em troca ao presidente sportinguista um estatuto ficcional de «líder do futebol português» que ele afanosamente busca. Faz-me lembrar o que se contava na Faculdade de Direito que teria sido dito pelo Prof. Marceio Caetano sobre a tese de doutoramento do Prof. Soares Martinez: «Tem partes boas e partes originais. Infelizmente, as partes boas não são originais e as originais não são boas».
Entre outras evidências, a regeneradora doutrina Bruno de Carvalho não podia falhar a defesa da profissionalização dos árbitros, cujos fundamentos estão longe de ser convincentes e consensuais, arriscando sim tornar-se uma armadilha bem pior (um árbitro que depende inteiramente do futebol para viver está muito mais indefeso e à mercê de várias influências e constrangimentos). Mas também defende o «sorteio puro» dos árbitros, um disparate que não é praticado em lado algum e competição alguma - é como se o Eduardo Barroso, no serviço que dirige, sorteasse os médicos para as intervenções cirúrgicas. Mas quando o sportinguista e presidente da Comissão de Arbitragem, Vítor Pereira, se atreveu a criticar o «plano», dizendo que ele em nada contribuía para a melhoria da arbitragem e do futebol português, Bruno de Carvalho explodiu de raiva, como só um presidente de um clube de cavalheiros se permite fazer. E vá de meter cá fora o Dazibao nr. 8/14 (e 429 da sua presidência), onde acusa Vítor Pereira de «cobardia e falta de interesse em alterar o que está mal no futebol português». Sim, porque, tendo o Sporting recebido um mandado divino para dizer o que está mal no futebol português e mandar alterar o que entender, só os cobardes ou malandros, coniventes com o mal, é que não marcham atrás, entusiasmadamente. Ser um clube de cavalheiros confere privilégios destes.
4- Não vou discutir mais uma vez o Apito Dourado, agora com o Eduardo Barroso. Mas sempre lhe digo que não esperava vê-lo argumentar à Rui Gomes da Silva, esse instigador profissional do ódio. Repito que o Apito Dourado foi investigado e julgado por 17 magistrados judiciais e do Ministério Público e apenas um magistrado do MP, obrigado a tal pela Dr.ª Maria José Morgado, se atreveu a deduzir acusação, escudado no precioso testemunho da D. Carolina Salgado, e tendo recebido do tribunal uma sentença tão devastadora e humilhante que eu recomendo vivamente ao Eduardo Barroso que a leia se, de facto, quer saber o que foi o Apito Dourado, se quer saber como é que tudo foi montado e planeado e se quer decifrar o mistério inicial de entender porque razão apenas o FC Porto e o Boavista foram alvos de investigação. Eu sei que dá trabalho e exige conhecimentos que, em grande parte, lhe serão estranhos, embora não incompreensíveis. Mas, se me viessem dizer que o Eduardo Barroso não percebe nada de transplantes de fígado, por mais corrosiva e fundamentada que me pudesse parecer a acusação, eu não me atreveria a dar-lhe crédito e, muito menos, a pronunciar-me sobre ela.
Não, eu não ouvi as escutas - estas ou quaisquer outras, porque sei bem do que se trata e como se usam. Quer saber se eu acredito que a «fruta» não eram meninas para o árbitro? Não, não acredito. Mas sei (note: sei) que todos os clubes faziam isso com todos os árbitros que o pediam. O que a justiça, desportiva e judicial, teria de provar era a existência de um nexo de causalidade entre isso e o resultado de um jogo - e foi isso que não foi capaz de fazer. Eu percebo a dificuldade em entender a importância do sacana do nexo da causalidade, mas não aceito a facilidade de conclusões dos leigos: também não sei dizer a diferença entre um apêndice e um duodeno, mas, por isso mesmo, não tiro conclusões por conveniência.
Em matéria de certezas, o que sei é que houve um clube cujo vice-presidente foi apanhado a transferir dinheiro para a conta de um árbitro que iria dirigir um jogo seu e sem conhecimento deste, a fim de depois, não gostando da arbitragem, o clube poder vir dizer que o árbitro fora comprado. Aconteceu há dois anos atrás e com o Sporting. O caso, sem precedentes conhecidos, está agora para ser julgado na justiça comum, mas nenhum processo foi aberto ao Sporting na justiça desportiva - tão diligente contra o FC Porto no Apito Dourado, que até o queria mandar para a segunda divisão. Dir-me-á o Eduardo Barroso que o Sporting não pode ser responsabilizado pela actuação de um seu dirigente. Não? Não era disso que se tratava no Apito Dourado?
Querem moralizar o futebol português? Eu também tenho algumas ideias sobre o assunto - não sei é se coincidem com as vossas. Porque, não sei porquê, desconfio que a vossa moralização consiste apenas em impedir que o F.C. Porto possa continuar a ganhar tanto como o tem feito neste últimos trinta anos.
abola
Não, com certeza dos descontos dados por Manuel Mota, no Porto-Marítimo, pois que ainda há dias se queixavam de só terem tido direito a 4 minutos de descontos na Amoreira. Não, certamente, do penalty que qualificou o FC Porto ao minuto 95, pois esse não vi ninguém que o tenha contestado (apesar de, obviamente, não coincidir com o «intensómetro» de Bruno de Carvalho). Em comparação com o penalty que deu o 3-1 ao Sporting em Penafiel - filho da velha escola leonina dos penalties à Manuel Fernandes e João Pinto, que consiste em adiantar a bola ao defesa e ficar à espera da perna dele para se fazer auto-rasteirar - o penalty do Dragão foi tão menos espectacular quanto mais sério. E, nem vale a pena comparar o de Penafiel com os dois perdoados ao Sporting no jogo com o Marítimo em Alvalade (nem haveria peixeirada alguma se eles têm sido assinalados). Assim, resta ao Sporting queixar-se de o jogo do Dragão ter começado 3 minutos mais tarde do que o de Penafiel e ter acabado... 4 minutos mais tarde. Concordo que não deveria ter acontecido e que o responsável ou responsáveis pelo atraso devem ser punidos conforme os regulamentos prevêem (embora não se perceba que o delay, que já vinha desde o início de ambos os jogos, não tenha sido corrigido ao intervalo por quem de direito). Mas, para que, à conta disso, se conclua pela conspiração, será necessário fazer prova de duas coisas: que o FC Porto só estava à espera de saber o resultado final do Sporting para decidir então quantos golos mais precisava de marcar ao Marítimo e que este, num gesto de boa vontade e em contraste com tudo o que até aí havia feito no jogo, se dispôs a facilitar as necessidades portistas. Nada que esteja fora do alcance da capacidade argumentativa do Sporting.
2- Por mim, o essencial deste desfecho está algures. Vi os 60 minutos finais do Sporting-Marítimo, da segunda jornada, e os 60 minutos iniciais do Porto-Marítimo da terceira jornada. Falta-me, pois, o conhecimento de causa completo para poder arriscar esta conclusão: nem Porto nem Sporting; quem merecia ter passado adiante era o Marítimo. Deu 60 minutos de banho de bola em Alvalade e outros tantos no Dragão. Sem esquecer o notável desempenho do Penafiel, que, em 17 dias empatou no Funchal, perdeu no Dragão, venceu Porto B e Benfica B para o seu campeonato e, enquanto as forças lho permitiram, ainda fez uma primeira parte contra o Sporting em que não se percebia qual das equipes era da primeira Liga.
3- Bruno de Carvalho (leia-se o Sporting) apresentou um plano para reformulação, ou moralização ou qualquer coisa em ão, do futebol português. Do que li, o dito plano parece-me pensado pela rama: um conjunto de banalidades e lugares-comuns, já muitas vezes ditas por outros e nunca suficientemente meditadas, além de lacunas evidentes e gritantes. Uma coisa para marcar terreno e reunir em Alvalade 22 súbditos atraídos pela possibilidade de mais dinheiro a cair do céu, dando em troca ao presidente sportinguista um estatuto ficcional de «líder do futebol português» que ele afanosamente busca. Faz-me lembrar o que se contava na Faculdade de Direito que teria sido dito pelo Prof. Marceio Caetano sobre a tese de doutoramento do Prof. Soares Martinez: «Tem partes boas e partes originais. Infelizmente, as partes boas não são originais e as originais não são boas».
Entre outras evidências, a regeneradora doutrina Bruno de Carvalho não podia falhar a defesa da profissionalização dos árbitros, cujos fundamentos estão longe de ser convincentes e consensuais, arriscando sim tornar-se uma armadilha bem pior (um árbitro que depende inteiramente do futebol para viver está muito mais indefeso e à mercê de várias influências e constrangimentos). Mas também defende o «sorteio puro» dos árbitros, um disparate que não é praticado em lado algum e competição alguma - é como se o Eduardo Barroso, no serviço que dirige, sorteasse os médicos para as intervenções cirúrgicas. Mas quando o sportinguista e presidente da Comissão de Arbitragem, Vítor Pereira, se atreveu a criticar o «plano», dizendo que ele em nada contribuía para a melhoria da arbitragem e do futebol português, Bruno de Carvalho explodiu de raiva, como só um presidente de um clube de cavalheiros se permite fazer. E vá de meter cá fora o Dazibao nr. 8/14 (e 429 da sua presidência), onde acusa Vítor Pereira de «cobardia e falta de interesse em alterar o que está mal no futebol português». Sim, porque, tendo o Sporting recebido um mandado divino para dizer o que está mal no futebol português e mandar alterar o que entender, só os cobardes ou malandros, coniventes com o mal, é que não marcham atrás, entusiasmadamente. Ser um clube de cavalheiros confere privilégios destes.
4- Não vou discutir mais uma vez o Apito Dourado, agora com o Eduardo Barroso. Mas sempre lhe digo que não esperava vê-lo argumentar à Rui Gomes da Silva, esse instigador profissional do ódio. Repito que o Apito Dourado foi investigado e julgado por 17 magistrados judiciais e do Ministério Público e apenas um magistrado do MP, obrigado a tal pela Dr.ª Maria José Morgado, se atreveu a deduzir acusação, escudado no precioso testemunho da D. Carolina Salgado, e tendo recebido do tribunal uma sentença tão devastadora e humilhante que eu recomendo vivamente ao Eduardo Barroso que a leia se, de facto, quer saber o que foi o Apito Dourado, se quer saber como é que tudo foi montado e planeado e se quer decifrar o mistério inicial de entender porque razão apenas o FC Porto e o Boavista foram alvos de investigação. Eu sei que dá trabalho e exige conhecimentos que, em grande parte, lhe serão estranhos, embora não incompreensíveis. Mas, se me viessem dizer que o Eduardo Barroso não percebe nada de transplantes de fígado, por mais corrosiva e fundamentada que me pudesse parecer a acusação, eu não me atreveria a dar-lhe crédito e, muito menos, a pronunciar-me sobre ela.
Não, eu não ouvi as escutas - estas ou quaisquer outras, porque sei bem do que se trata e como se usam. Quer saber se eu acredito que a «fruta» não eram meninas para o árbitro? Não, não acredito. Mas sei (note: sei) que todos os clubes faziam isso com todos os árbitros que o pediam. O que a justiça, desportiva e judicial, teria de provar era a existência de um nexo de causalidade entre isso e o resultado de um jogo - e foi isso que não foi capaz de fazer. Eu percebo a dificuldade em entender a importância do sacana do nexo da causalidade, mas não aceito a facilidade de conclusões dos leigos: também não sei dizer a diferença entre um apêndice e um duodeno, mas, por isso mesmo, não tiro conclusões por conveniência.
Em matéria de certezas, o que sei é que houve um clube cujo vice-presidente foi apanhado a transferir dinheiro para a conta de um árbitro que iria dirigir um jogo seu e sem conhecimento deste, a fim de depois, não gostando da arbitragem, o clube poder vir dizer que o árbitro fora comprado. Aconteceu há dois anos atrás e com o Sporting. O caso, sem precedentes conhecidos, está agora para ser julgado na justiça comum, mas nenhum processo foi aberto ao Sporting na justiça desportiva - tão diligente contra o FC Porto no Apito Dourado, que até o queria mandar para a segunda divisão. Dir-me-á o Eduardo Barroso que o Sporting não pode ser responsabilizado pela actuação de um seu dirigente. Não? Não era disso que se tratava no Apito Dourado?
Querem moralizar o futebol português? Eu também tenho algumas ideias sobre o assunto - não sei é se coincidem com as vossas. Porque, não sei porquê, desconfio que a vossa moralização consiste apenas em impedir que o F.C. Porto possa continuar a ganhar tanto como o tem feito neste últimos trinta anos.
abola