1- Não quero repetir a imorredoira frase do Prof. Cavaco Silva de que nunca me engano e raramente tenho dúvidas. Mas, no que respeita a avaliar jogadores de futebol a partir das primeiríssimas impressões, embora às vezes tenha dúvidas, poucas vezes me engano - desculpem a presunção. Que, aliás, não é assim tão atrevida, pois que acredito que quem está habituado a ver muito futebol é capaz de avaliar um jogador à primeira vista.
Um dos meus grandes enganos foi o João Moutinho, quando chegou ao FC Porto. Eu via-o jogar na televisão e não via ali nada de marcante: nem golos, nem passes para golos, nem capacidade de ruptura. Mas depois comecei a vê-lo jogar ao vivo e a minha opinião mudou radicalmente, quando percebi, vendo-o ocupar os espaços em campo, que ele era o facilitador dos golos, dos passes para golos, das rupturas. Era o músculo, o coração, que distribuía o sangue por todo o jogo da equipa. Exactamente o inverso do Silvestre Varela: na televisão, via-o e vejo-o (como todos nós, embora alguns gostem de fingir que não vêm), a perder a bola mal a recebe, a travar o jogo quando é lançado em velocidade, a estragar jogada após jogada. Mas, no estádio, vejo ainda um jogador que se defende permanentemente, fugindo das zonas de combate, que se bamboleia devagarinho por onde não há bola, tentando aproximar-se de mansinho da zona de decisão, em busca de uma bola perdida que lhe permita o golo salvador capaz de enganar observadores generosos. Não há como ter uma boa imprensa!
Mas, assim que vi os primeiros minutos do McCarthy, do Hulk ou do Deco, corri a escrever que ali estavam predestinados. E, inversamente, quando insisti que o Chainho ou o Mariano Gonzalez não iriam a lado algum. Ou, mais recentemente, quando me deslumbrei mal vi jogar o Cristian Atsu, ou quando declarei, e mantenho, que o Defour é um jogador banalíssimo, como já vi centenas em equipas secundárias. Claro que estou consciente de que este é um exercício de opinião que pode ser muito antipático e até injusto. Mas são os ossos do ofício — deles e nossos. Se não estamos cá para dizer que Fulano é excelente e Sicrano é banal, estamos cá para quê? O Defour tem o sonho, inteiramente legítimo, de ser, como ontem vi escrito aqui, «o sucessor natural de João Moutinho». Fica-lhe bem o sonho e o apoio de que goza também na imprensa. Mas eu pergunto-me: porquê o sucessor natural? O que há de comum entre Moutinho e Defour, tirando a coincidência de ocuparem a mesma área de jogo? Será que não se vê a olho nu que tudo o que há em Moutinho de excelência técnica, inteligência de jogo, capacidade de mexer com todo o movimento da equipa, está absolutamente ausente do futebol de Defour? Poder-se-ia dizer que ele é o sucessor natural de Moutinho porque, simplesmente, não há outro para o lugar. Mas, não: eu vi um quarto-de-hora do Herrera, que me pareceu vários degraus acima; vi uma hora do Josué, suficiente para perceber o quão melhor é ele; e ainda há mais uns três ou quatro médios, que são novidade e que não tiveram palco suficiente. Mas, sobretudo e enfim, vi dez minutos — não mais do que isso, dez minutos — de um menino chamado Juan Quintero e, meus amigos, bem pode sonhar o Defour, como eu posso sonhar substituir o Messi no Barcelona.
Vi, então, dez minutos e quatro intervenções de Quintero. A prudência mandaria que esperasse para ver mais, mas não vale a pena. Aquele miúdo de 1,69 metros é um génio deste jogo, que apenas um crime de lesa-futebol justificaria que ficasse sentado no banco a ver jogar o Defour ou qualquer outro. Compreendo que o Paulo Fonseca até tenha medo de o soltar assim sem mais, que tenha até pudor de mostrar aos adversários, e logo de entrada, o que ali tem. Mas vai ter de o fazer e mais depressa do que talvez gostasse. Porque o público o vai exigir, porque a justiça o vai tornar inevitável e porque ele não quererá passar à história como o homem que sentou o Quintero no banco para fazer jogar um tal de Defour.
Aliás, e regressando à conversa da semana passada, se bem que tenha de aceitar (sem, todavia, compreender) a estratégia de começar a jogar com o onze da época anterior, a verdade é que o novo esquema de jogo de Paulo Fonseca — o 2x1 do meio campo - e a fantástica qualidade de talentos ao seu dispor, obrigam, em minha opinião, a rever todos os direitos adquiridos. Tal como vejo as coisas, não só o Defour não tem lugar no onze titular, como também o não tem o Fernando. Ambos foram dois corpos estranhos, inertes, fora de pauta, no carrossel de virtudes revelado pelo FC Porto no jogo da Supertaça. Só se deu pelo Fernando, aquando das suas numerosas e inúteis faltas, bem reveladoras da sua incapacidade de jogar em antecipação e em leitura de jogo. É um grande destruidor de jogo — embora perigoso para a equipa na forma como o faz — mas, quando o jogo é de sentido único e de ataque (como o vai ser em 80% das ocasiões), o Fernando é absolutamente incapaz de construir jogo, de acompanhar a manobra ofensiva, e chega a ser confrangedor quando, por acaso, se apanha em zona de decisão: é como se nunca tivesse visto uma bola de futebol à frente. E, pois, se a ideia de Paulo Fonseca é jogar com dois médios recuados e o Lucho bastante adiantado, para que precisa ele que um dos médios recuados seja um clássico trinco, apenas de vocação defensiva? Desculpem-me mais uma vez a presunção: mas não está na cara que aquele meio-campo, para semear o terror entre os adversários, deverá ser formado pelo trio Quintero-Josué-Lucho?
Mas, pronto, eu não percebo nada do assunto. Aceito todos os argumentos em contrário, menos um: não me venham dizer que, para jogar o Quintero, terá de sair o Lucho ou vice-versa. Nenhum jogador tão potencialmente genial como Quintero terá de ficar de fora em obediência a uma ideia ainda mais genial do seu treinador. Como me disse um amigo sportinguista, também ele entusiasmado com os dez minutos do Quintero, «descansa, que o Paulo Fonseca sabe muito bem o que está fazer! Um jogador daqueles nunca será desaproveitado!». E eu acredito que sim.
2- Licá foi a grande surpresa de Paulo Fonseca. A mim, apanhou-me completamente de surpresa: a escolha e a grande exibição do jogador. Mas, aí está: ao contrário do Quintero, eu não sei dizer se foi uma noite de inspiração ou uma certeza para futuro. Mas, lá que entrou com o pé direito, isso é incontestável. Tomara eu que o Varela, com lugar cativo até à eternidade, assinasse uma só exibição semelhante em toda a época!
3- A superioridade do FC Porto sobre o Vitória, num jogo cujo resultado minimamente justo teria sido um 6-0, foi de tal maneira sufocante que fiquei sem saber se é o Porto que vai arrasar ou o Vitória que está absolutamente impreparado para o campeonato que arranca no final da semana. Mas, para a história, fica o habitual: mais uma Supertaça, mais um título, mais um desassossego espalhado pela Segunda Circular. Ah, como eu gosto desta história!
4- Bruno de Carvalho entrou em campo em Portimão qual um César regressado de uma campanha vitoriosa. Perante os adeptos sportinguistas, apresentou-se como a verdadeira, a única, vedeta da equipa. A seguir, passou boa parte do jogo a protestar ao vivo com os árbitros — excepto quando estes, no quarto minuto de descontos da primeira parte, inventaram um penalty para pôr o Sporting a ganhar. E, no final, porque, estando a perder, só lhe concederam mais 3 minutos de descontos, armou um escarcéu contra a arbitragem e até fez um comunicado a declarar que «detestava perder». Num jogo a brincar, de uma coisa chamada Torneio do Guadiana. Como será quando for a doer? Teme-se o pior: mais do mesmo Sporting de sempre, mas em versão Vale e Azevedo. Só faço uma pergunta: o que diriam se todo aquele escabeche tem sido protagonizado por Pinto da Costa?
Um dos meus grandes enganos foi o João Moutinho, quando chegou ao FC Porto. Eu via-o jogar na televisão e não via ali nada de marcante: nem golos, nem passes para golos, nem capacidade de ruptura. Mas depois comecei a vê-lo jogar ao vivo e a minha opinião mudou radicalmente, quando percebi, vendo-o ocupar os espaços em campo, que ele era o facilitador dos golos, dos passes para golos, das rupturas. Era o músculo, o coração, que distribuía o sangue por todo o jogo da equipa. Exactamente o inverso do Silvestre Varela: na televisão, via-o e vejo-o (como todos nós, embora alguns gostem de fingir que não vêm), a perder a bola mal a recebe, a travar o jogo quando é lançado em velocidade, a estragar jogada após jogada. Mas, no estádio, vejo ainda um jogador que se defende permanentemente, fugindo das zonas de combate, que se bamboleia devagarinho por onde não há bola, tentando aproximar-se de mansinho da zona de decisão, em busca de uma bola perdida que lhe permita o golo salvador capaz de enganar observadores generosos. Não há como ter uma boa imprensa!
Mas, assim que vi os primeiros minutos do McCarthy, do Hulk ou do Deco, corri a escrever que ali estavam predestinados. E, inversamente, quando insisti que o Chainho ou o Mariano Gonzalez não iriam a lado algum. Ou, mais recentemente, quando me deslumbrei mal vi jogar o Cristian Atsu, ou quando declarei, e mantenho, que o Defour é um jogador banalíssimo, como já vi centenas em equipas secundárias. Claro que estou consciente de que este é um exercício de opinião que pode ser muito antipático e até injusto. Mas são os ossos do ofício — deles e nossos. Se não estamos cá para dizer que Fulano é excelente e Sicrano é banal, estamos cá para quê? O Defour tem o sonho, inteiramente legítimo, de ser, como ontem vi escrito aqui, «o sucessor natural de João Moutinho». Fica-lhe bem o sonho e o apoio de que goza também na imprensa. Mas eu pergunto-me: porquê o sucessor natural? O que há de comum entre Moutinho e Defour, tirando a coincidência de ocuparem a mesma área de jogo? Será que não se vê a olho nu que tudo o que há em Moutinho de excelência técnica, inteligência de jogo, capacidade de mexer com todo o movimento da equipa, está absolutamente ausente do futebol de Defour? Poder-se-ia dizer que ele é o sucessor natural de Moutinho porque, simplesmente, não há outro para o lugar. Mas, não: eu vi um quarto-de-hora do Herrera, que me pareceu vários degraus acima; vi uma hora do Josué, suficiente para perceber o quão melhor é ele; e ainda há mais uns três ou quatro médios, que são novidade e que não tiveram palco suficiente. Mas, sobretudo e enfim, vi dez minutos — não mais do que isso, dez minutos — de um menino chamado Juan Quintero e, meus amigos, bem pode sonhar o Defour, como eu posso sonhar substituir o Messi no Barcelona.
Vi, então, dez minutos e quatro intervenções de Quintero. A prudência mandaria que esperasse para ver mais, mas não vale a pena. Aquele miúdo de 1,69 metros é um génio deste jogo, que apenas um crime de lesa-futebol justificaria que ficasse sentado no banco a ver jogar o Defour ou qualquer outro. Compreendo que o Paulo Fonseca até tenha medo de o soltar assim sem mais, que tenha até pudor de mostrar aos adversários, e logo de entrada, o que ali tem. Mas vai ter de o fazer e mais depressa do que talvez gostasse. Porque o público o vai exigir, porque a justiça o vai tornar inevitável e porque ele não quererá passar à história como o homem que sentou o Quintero no banco para fazer jogar um tal de Defour.
Aliás, e regressando à conversa da semana passada, se bem que tenha de aceitar (sem, todavia, compreender) a estratégia de começar a jogar com o onze da época anterior, a verdade é que o novo esquema de jogo de Paulo Fonseca — o 2x1 do meio campo - e a fantástica qualidade de talentos ao seu dispor, obrigam, em minha opinião, a rever todos os direitos adquiridos. Tal como vejo as coisas, não só o Defour não tem lugar no onze titular, como também o não tem o Fernando. Ambos foram dois corpos estranhos, inertes, fora de pauta, no carrossel de virtudes revelado pelo FC Porto no jogo da Supertaça. Só se deu pelo Fernando, aquando das suas numerosas e inúteis faltas, bem reveladoras da sua incapacidade de jogar em antecipação e em leitura de jogo. É um grande destruidor de jogo — embora perigoso para a equipa na forma como o faz — mas, quando o jogo é de sentido único e de ataque (como o vai ser em 80% das ocasiões), o Fernando é absolutamente incapaz de construir jogo, de acompanhar a manobra ofensiva, e chega a ser confrangedor quando, por acaso, se apanha em zona de decisão: é como se nunca tivesse visto uma bola de futebol à frente. E, pois, se a ideia de Paulo Fonseca é jogar com dois médios recuados e o Lucho bastante adiantado, para que precisa ele que um dos médios recuados seja um clássico trinco, apenas de vocação defensiva? Desculpem-me mais uma vez a presunção: mas não está na cara que aquele meio-campo, para semear o terror entre os adversários, deverá ser formado pelo trio Quintero-Josué-Lucho?
Mas, pronto, eu não percebo nada do assunto. Aceito todos os argumentos em contrário, menos um: não me venham dizer que, para jogar o Quintero, terá de sair o Lucho ou vice-versa. Nenhum jogador tão potencialmente genial como Quintero terá de ficar de fora em obediência a uma ideia ainda mais genial do seu treinador. Como me disse um amigo sportinguista, também ele entusiasmado com os dez minutos do Quintero, «descansa, que o Paulo Fonseca sabe muito bem o que está fazer! Um jogador daqueles nunca será desaproveitado!». E eu acredito que sim.
2- Licá foi a grande surpresa de Paulo Fonseca. A mim, apanhou-me completamente de surpresa: a escolha e a grande exibição do jogador. Mas, aí está: ao contrário do Quintero, eu não sei dizer se foi uma noite de inspiração ou uma certeza para futuro. Mas, lá que entrou com o pé direito, isso é incontestável. Tomara eu que o Varela, com lugar cativo até à eternidade, assinasse uma só exibição semelhante em toda a época!
3- A superioridade do FC Porto sobre o Vitória, num jogo cujo resultado minimamente justo teria sido um 6-0, foi de tal maneira sufocante que fiquei sem saber se é o Porto que vai arrasar ou o Vitória que está absolutamente impreparado para o campeonato que arranca no final da semana. Mas, para a história, fica o habitual: mais uma Supertaça, mais um título, mais um desassossego espalhado pela Segunda Circular. Ah, como eu gosto desta história!
4- Bruno de Carvalho entrou em campo em Portimão qual um César regressado de uma campanha vitoriosa. Perante os adeptos sportinguistas, apresentou-se como a verdadeira, a única, vedeta da equipa. A seguir, passou boa parte do jogo a protestar ao vivo com os árbitros — excepto quando estes, no quarto minuto de descontos da primeira parte, inventaram um penalty para pôr o Sporting a ganhar. E, no final, porque, estando a perder, só lhe concederam mais 3 minutos de descontos, armou um escarcéu contra a arbitragem e até fez um comunicado a declarar que «detestava perder». Num jogo a brincar, de uma coisa chamada Torneio do Guadiana. Como será quando for a doer? Teme-se o pior: mais do mesmo Sporting de sempre, mas em versão Vale e Azevedo. Só faço uma pergunta: o que diriam se todo aquele escabeche tem sido protagonizado por Pinto da Costa?