1- Acho que a única notícia relevante do fim-de-semana desportivo foi a vitória das Ilhas Feroé sobre a Grécia e em Atenas. A vitória de uma selecção de um país inventado para efeitos futebolísticos, com cerca de 50.000 habitantes, sobre a Selecção que em 2004 nos roubou nas barbas o título europeu é, de facto, qualquer coisa de verdadeiramente surpreendente. Mesmo que, desde 2004, a Grécia tenha sido, consistentemente, uma equipa que jogava um futebol feio, defensivo e sem qualquer interesse. Bem fez Fernando Santos em ir-se embora, uma vez consumada a autêntica proeza que foi levar esta Seleccão ao Mundial do Brasil.
No que me diz respeito, foi um fim-de-semana de descanso, em termos televisivo-desportivos. Vi um pouco do jogo da nossa Selecção contra a Arménia, mas, como de costume, rapidamente me aborreci. Aquilo não é futebol que me entusiasme minimamente, apesar do rol de estrelas que desfilamos, da alta cotação no ranking da FIFA e das novas esperanças criadas pela substituição de Paulo Bento por Fernando Santos. Há um mal endémico na nossa Selecção que a faz jogar sempre menos do que a soma dos seus nomes permitiria esperar. É uma equipa presa de movimentos, titubeante na defesa, amarrada no meio campo, estranhamente inóqua no ataque. Quando Ronaldo está em dia sim, ainda dá para disfarçar algumas coisas, mas não todas. Quando está em dia não, não resta nada ou quase nada que valha o espectáculo. E, depois, não sei se serei eu que sou exigente de mais, mas não consigo habituar-me a esta tendência actual de se garantir que todos os adversários são difíceis, que ganhar à Arménia por 1-0 em casa já é um bom resultado, como o teria sido um empate caseiro com a Albânia. Eu sei que os tempos do futebol de tamancos já acabaram em todo o lado, mas, mesmo assim, caramba, em contraste com a nossa constelação de vedetas internacionais, alguém é capaz de dizer de cor o nome de um jogador albanês ou arménio?
E achei engraçado que a nossa imprensa, que vive a louvar as pequenas equipes que, nos jogos entre-portas, estendem um autocarro em frente à baliza e renunciam à partida em jogar no campo todo (e agradecem se o campo todo for de dimensões mais próprias do futebol juvenil ou feminino do que de futebol de homens), desta vez, logo trataram de desculpar a exibição da nossa Selecção com o autocarro arménio estacionado em frente à sua baliza. Porém, e do pouco que vi, foi uma sorte que o autocarro arménio não tivesse facturado primeiro que o Ferrari lusitano.. .E foi outra sorte que o nosso golo não tivesse sido considerado em off-side, como me pareceu.
2- Domingo à noite, espreitei ainda um quarto-de-hora do Itália-Croácia, também para o Europeu. Grandes jogadores, tecnicamente, de um lado e do outro, e um futebol de adormecer criancinhas. E volto à minha eterna questão: não haverá jogos a mais de Selecções, para os quais os jogadores ou aparecem cansados por uma época desgastante ao serviço das suas equipas (nas fases finais), ou (na fase de qualificação), aparecem meio desmotivados, com a cabeça noutro lado, envolvidos, antes de mais, na carreira das suas equipas?
Hoje à noite, por exemplo, apesar do aliciante do cartaz, Portugal e Argentina não vão fazer nada a Manchester senão abastecerem de dólares os cofres das suas Federações. Apesar de hoje em dia o número de jogos particulares das Selecções estar limitado pela FIFA, e como forma de pôr termo aos abusos anteriores, continua a haver uma profusão de jogos sem qualquer interesse do ponto de vista competitivo e de espectáculo, que apenas aproveitam, financeiramente, às Federações e seus quadros e a alguns jogadores, para quem o prémio de presença é importante. Tudo feito, claro, em prejuízo dos clubes, que são quem paga os ordenados aos jogadores... para os ter ao seu serviço. Dentro de dois meses, por exemplo, vem ai o CAN, imposto a ferros e oferecido à Guiné Equatorial, que vai levar dos clubes europeus, durante mês e meio e no auge das competições internas e europeias, os melhores jogadores africanos ao seu dispor. E depois temos as Selecções da América do Sul, como a Argentina e, sobretudo, o Brasil, que, sem adversários nem competições à altura no seu continente, deambulam pelo mundo inteiro em jogos de exibição para que convocam as suas vedetas emigradas na Europa, enchendo de dólares os cofres que permitem aos seus dirigentes viverem como nababos. Suponho que um dia isto terá de acabar, não sei é quando.
3- Julgava que o meu fim-de-semana televisivo seria salvo pela final do Masters, mas afinal tive, eu e todos os amantes do ténis, a grande decepção de ver a final cancelada por impedimento físico de Federer. Foi uma pena, porque eu sou devoto do suíço, que considero o jogador com o ténis mais bonito e mais completo que alguma vez vi e que, além do mais e não por acaso, acaba de ser distinguido entre os seus pares e pela sexta vez, o mais desportista do circuito ATP. Independentemente de todos os recordes que regista, Federer é um verdadeiro gentleman, fora e dentro do court, representando de forma brilhante tudo aquilo que faz do ténis o mais espectacular, o mais sério e o mais elitista, no bom sentido, de todos os desportos. Já repararam que no ténis nunca houve um caso de doping ou de resultado comprado?
Enfim, embora eu não tivesse grandes esperanças de que Roger Federer conseguisse resistir a essa máquina destruidora que é Djoikovic, também não tinha dúvidas de que iria vender cara a derrota e de que nos estariam destinadas umas três horas de puro prazer. Mas Federer preferiu poupar as costas para a final da Taça Davis, entre a Suíça e a França, que é já a seguir.
4- Embora o tema seja complicado por natureza, não posso deixar de cumprimentar o manifesto anti-barbas do Sr. Ilhan Cavcav, presidente do modesto Gençlerbirligi, actual nono classificado do campeonato turco. As barbas de Raul Meireles, e não só, são, de facto, um espectáculo dentro do espectáculo - mas, não só não o deveriam ser (e sim o futebol por ele jogado), como também o espectáculo é esteticamente nada recomendável. E se às barbas juntarmos as tatuagens em série e os inacreditáveis e sempre alterados penteados das vedetas dos estádios, aquela mania de saírem sempre dos autocarros com headhphones colados aos ouvidos, caras de personagens superiores e inatingíveis e absoluta ausência de quaisquer sinais exteriores de que são capazes de ocupar os tempos livres a ler um livro, um jornal, uma revista, mais as eternamente repetidas e absolutamente desinteressantes declarações que fazem, recheadas de frases feitas que nem se percebe se eles percebem, temos de convir que a imagem que os jogadores de futebol de topo hoje transmitem de si mesmos é de uma pobreza intelectual e de uma falta de gosto chocantes. A imagem de quem, fora de campo, apenas se preocupa com dinheiro e contratos, tatuagens e penteados. A quem nada interessa saber do país onde vivem e do mundo que os rodeia. E, como essa é a imagem transmitida a milhões de jovens em todo o mudo que os idolatram, não se trata apenas de uma questão de gosto ou de valores, mas de responsabilidade. Lamento, mas é o que penso.